Se fosse vivo, Alfredo Fernandes Martins, carinhosamente conhecido entre nós, alunos de Geografia na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, como Fred, completaria 100 Anos. Infelizmente a morte levou-o em dezembro de 1982, no ano em que foi meu professor de Geografia Física II.
Dos poucos meses de convívio enquanto seu aluno, recordo uma pequena história que ele nos contou na aula. Era dezembro, estava bastante frio, a Sala de Cartas e Relevos, onde tínhamos as aulas teóricas, estava gelada. De repente, ele disse:
- Esta manhã a minha criada foi à varanda, leu o termómetro e disse, 7.º, que dia frio está hoje ... se fosse um Esquimó (ele pronunciou ésquimo), diria, que lindo dia de verão ...
Hoje, no Facebook, no Grupo Geografia - Coimbra, o Rui Jacinto publicou o texto que abaixo e com a devida vénia, transcrevo ....
Alfredo Fernandes Martins (Coimbra, 19.01.1916 - 29.12.1982)
Geografo, Professor.
Geografo, Professor.
(I) O Homem e a Obra: perfil do cidadão e do académico
Alguns apontamentos para uma lembrança do legado do Professor Alfredo
Fernandes Martins no Centenário do seu nascimento (19 de Janeiro).
As várias notas, testemunhos, artigos e, mesmo, uma fotobiografia
publicada sobre o Professor Alfredo Fernandes Martins permitem esboçar o
perfil dum geógrafo que marcou uma época da geografia portuguesa, do
académico brilhante, do professor eloquente, que influenciou várias
gerações de estudantes, do cidadão empenhado, comprometido, por vezes,
controverso.
Adiantam-se alguns fragmentos para compor o seu retrato:
Adiantam-se alguns fragmentos para compor o seu retrato:
“Em finais de Dezembro de 1982, inesperada e subitamente, faleceu
Alfredo Fernandes Martins. Apesar da morte prematura aos 66 anos de
idade, teve uma vida cheia e rica, completa mesmo, atrevemo-nos a dizer,
tal foi a dedicação, a intensidade, o empenhamento e o brilho com que
viveu as suas diferentes facetas de professor, de geógrafo e de cidadão.
Uma vida intensa e muito marcante para todos os que, como alunos,
colegas ou simples companheiros de uma qualquer jornada, tiveram o
privilégio de com ele partilhar conversas, ideias, viagens e emoções.
Daí a força do sentimento de saudade que deixa em todos. A comunidade
geográfica portuguesa, a Universidade e a cidade de Coimbra ficaram mais
pobres...”
(António Campar de Almeida; António Gama; Fernanda Delgado Cravidão; Paula Fernandes Martins; Rui Jacinto) (*)
(António Campar de Almeida; António Gama; Fernanda Delgado Cravidão; Paula Fernandes Martins; Rui Jacinto) (*)
“O Sr. Dr. Alfredo Fernandes Martins, que hoje se apresenta a receber o
mais alto grau académico, sente em si a vocação de geógrafo. E friso
bem «vocação», porque julgo não exagerar afirmando que nele se reúnem
todos ou quase todos desta Universidade julgou necessários a um moço
geógrafo.
O Sr. Dr. Fernandes Martins, sem desprezar o estudo de gabinete, é essencialmente um geógrafo-caminheiro. Quem já andou, com o fim de recolher material dialectológico, por aldeias desconfortáveis, que nem sequer são servidas por estradas, pode bem avaliar a soma de sacrifícios e de abnegação que exigem alguns estudos de geografia física ou humana. Recordo, neste momento, a agradável surpresa que tive um dia, ao encontrar, numa povoação da Beira Baixa, onde estava a fazer estudos linguísticos, um colega que, na mesma região, andava a proceder a estudos geográficos. Depois do trabalho de cada um, realizado, como é natural, separadamente, que fecunda não era a troca de impressões, à noitinha!
Poder-se-á dizer que a preocupação literária é por vezes excessiva, afastando-se o Autor daquela sobriedade própria dos trabalhos científicos, sobriedade que facilmente atingiu, passados alguns anos, na sua dissertação de doutoramento. Mas o Sr. Dr. Fernandes Martins foi levado a fazê-lo por um impulso a que poderia chamar de «proselitismo geográfico», bem necessário num país onde – como ele escreve no prefácio – «o gosto pela geografia anda um tanto obliterado». O novo doutor não é um cientista frio, e esta característica, a terceira que desejava salientar e que é uma consequência da sua vocação geográfica, de que falei atrás, constitui, para mim, uma das facetas mais simpáticas da sua personalidade.
O Sr. Dr. Fernandes Martins, sem desprezar o estudo de gabinete, é essencialmente um geógrafo-caminheiro. Quem já andou, com o fim de recolher material dialectológico, por aldeias desconfortáveis, que nem sequer são servidas por estradas, pode bem avaliar a soma de sacrifícios e de abnegação que exigem alguns estudos de geografia física ou humana. Recordo, neste momento, a agradável surpresa que tive um dia, ao encontrar, numa povoação da Beira Baixa, onde estava a fazer estudos linguísticos, um colega que, na mesma região, andava a proceder a estudos geográficos. Depois do trabalho de cada um, realizado, como é natural, separadamente, que fecunda não era a troca de impressões, à noitinha!
Poder-se-á dizer que a preocupação literária é por vezes excessiva, afastando-se o Autor daquela sobriedade própria dos trabalhos científicos, sobriedade que facilmente atingiu, passados alguns anos, na sua dissertação de doutoramento. Mas o Sr. Dr. Fernandes Martins foi levado a fazê-lo por um impulso a que poderia chamar de «proselitismo geográfico», bem necessário num país onde – como ele escreve no prefácio – «o gosto pela geografia anda um tanto obliterado». O novo doutor não é um cientista frio, e esta característica, a terceira que desejava salientar e que é uma consequência da sua vocação geográfica, de que falei atrás, constitui, para mim, uma das facetas mais simpáticas da sua personalidade.
SENHOR REITOR DA UNIVERSIDADE:
O Sr. Dr. Alfredo Fernandes Martins, quer pelos seus méritos científicos, que procurei evidenciar na minha exposição, quer pela categoria intelectual do seu ilustre patrono, é digno de receber solenemente o grau de doutor. Rogo, pois, a V. Ex.ª lho conceda, não só como prémio pela actividade já desenvolvida no campo da sua especialidade, mas também como estímulo para o futuro.
Manuel de Paiva Bóleo (*)
A Obra do Professor Alfredo Fernandes Martins: uma sintética e subjectiva escolha:
Os trabalhos que se destacam correspondem a uma escolha subjetiva que não deixam de evidenciar tanto o percurso e interesses do seu autor como os temas que marcaram uma época da geografia protuguesa:
Os trabalhos que se destacam correspondem a uma escolha subjetiva que não deixam de evidenciar tanto o percurso e interesses do seu autor como os temas que marcaram uma época da geografia protuguesa:
. O esforço do Homem na Bacia do Mondego (1940) – dissertação de licenciatura.
. O Maciço Calcário Estremenho. Contribução para um estudo de Geografia Física (1949) – dissertação de doutoramento.
. Le Centre Littoral et le Massif Calcaire d’Estremadura. Livret-guide de l’excursion B du XVIe Congrès International de Géographie, Lisboa (1949).
. Princípios de Geografia Humana, de P. Vidal de la Blache ( tradução, com prefácio, notas e ilustração). Editorial Cosmos, Col. A marcha da Humanidade, secção III, nº1, Lisboa (1946; 2ª ed. 1954).
. Alguns reparos à classificação das colónias proposta por Hardy. Boletim do Instituto de Estudos Franceses, Coimbra, 2-3, 1941-1943 (1944).
. O condicionalismo geográfico na expansão portuguesa. Boletim da Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra, Coimbra, 5 (1964)
. Participa na Missão de Geografia Física e Humana do Ultramar, desenvolvendo trabalho em: Desenvolveu trabalhos em Moçambique (Nampula) e Angola (Luanda) (1961); Moçambique (Nampula, Planalto dos Macondes, Litoral de Porto Amélia) (1962); Moçambique (Quelimane) (1964); Moçambique (Porto Amélia e Pebane) (1965); Moçambique (Morfologia Litoral - da Foz do Rio Molocué à Baía de Condúcia) (1966).
. Geografia Humana do Brasil. Brasília, Coimbra, 3 (1944).
. Grandeza, declínio e novas possibilidades da borracha brasileira. Brasília, Coimbra, 3 (1944).
. Participa na Missão Oficial Portuguesa à cidade de Salvador (Baía – Brasil) (1959).
.Esta Coimbra... – Alguns apontamentos para uma palestra. Boletim Comemorativo do Sexto Aniversário do Clube Desportivo de Celas, Coimbra (1951).
. A Porta do Sol – Contribuição para o estudo da cerca medieval coimbrã. Biblos, Coimbra, XXVII (1952).
. Em prol dos campos do Mondego, Coimbra (1953).
. O drama da planície. Boletim Comemorativo do Décimo Aniversário do Ateneu de Coimbra, Coimbra (1950).
. Portugal. in Dicionário Chorográfico de Portugal Continental e Insular de Américo Costa (1947).
. Tríptico Galego, Coimbra (1953).
. Participa na Missão Arqueológica da Universidade de Coimbra no Iraque (1958).
. Trabalha no Laboratoire de Géomorphologie do Institut de Géographie de Paris, tendo contactado com M. Ters, Pierre Georges, André Cailleux, Henri Elhaï, Henri Enjalbert e Pièrre Barrèrre (1964), familiarizando-se com técnicas laboratoriais de calcimetria e determinação de minerais pesados (1965) (*)
. O Maciço Calcário Estremenho. Contribução para um estudo de Geografia Física (1949) – dissertação de doutoramento.
. Le Centre Littoral et le Massif Calcaire d’Estremadura. Livret-guide de l’excursion B du XVIe Congrès International de Géographie, Lisboa (1949).
. Princípios de Geografia Humana, de P. Vidal de la Blache ( tradução, com prefácio, notas e ilustração). Editorial Cosmos, Col. A marcha da Humanidade, secção III, nº1, Lisboa (1946; 2ª ed. 1954).
. Alguns reparos à classificação das colónias proposta por Hardy. Boletim do Instituto de Estudos Franceses, Coimbra, 2-3, 1941-1943 (1944).
. O condicionalismo geográfico na expansão portuguesa. Boletim da Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra, Coimbra, 5 (1964)
. Participa na Missão de Geografia Física e Humana do Ultramar, desenvolvendo trabalho em: Desenvolveu trabalhos em Moçambique (Nampula) e Angola (Luanda) (1961); Moçambique (Nampula, Planalto dos Macondes, Litoral de Porto Amélia) (1962); Moçambique (Quelimane) (1964); Moçambique (Porto Amélia e Pebane) (1965); Moçambique (Morfologia Litoral - da Foz do Rio Molocué à Baía de Condúcia) (1966).
. Geografia Humana do Brasil. Brasília, Coimbra, 3 (1944).
. Grandeza, declínio e novas possibilidades da borracha brasileira. Brasília, Coimbra, 3 (1944).
. Participa na Missão Oficial Portuguesa à cidade de Salvador (Baía – Brasil) (1959).
.Esta Coimbra... – Alguns apontamentos para uma palestra. Boletim Comemorativo do Sexto Aniversário do Clube Desportivo de Celas, Coimbra (1951).
. A Porta do Sol – Contribuição para o estudo da cerca medieval coimbrã. Biblos, Coimbra, XXVII (1952).
. Em prol dos campos do Mondego, Coimbra (1953).
. O drama da planície. Boletim Comemorativo do Décimo Aniversário do Ateneu de Coimbra, Coimbra (1950).
. Portugal. in Dicionário Chorográfico de Portugal Continental e Insular de Américo Costa (1947).
. Tríptico Galego, Coimbra (1953).
. Participa na Missão Arqueológica da Universidade de Coimbra no Iraque (1958).
. Trabalha no Laboratoire de Géomorphologie do Institut de Géographie de Paris, tendo contactado com M. Ters, Pierre Georges, André Cailleux, Henri Elhaï, Henri Enjalbert e Pièrre Barrèrre (1964), familiarizando-se com técnicas laboratoriais de calcimetria e determinação de minerais pesados (1965) (*)
(*) Para aprofundar as múltiplas facetas do geógrafo e do cidadão consultar a (foto)biografia:
Alfredo Fernandes Martins: geógrafo de Coimbra, cidadão do mundo. António Campar de Almeida; António Gama; Fernanda Delgado Cravidão; Paula Fernandes Martins; Rui Jacinto. Coimbra: Instituto de Estudos Geográficos. Centro de Estudos Geográficos, 2006."
Alfredo Fernandes Martins: geógrafo de Coimbra, cidadão do mundo. António Campar de Almeida; António Gama; Fernanda Delgado Cravidão; Paula Fernandes Martins; Rui Jacinto. Coimbra: Instituto de Estudos Geográficos. Centro de Estudos Geográficos, 2006."
Comentários